09 agosto, 2009



Paris, 1946
(uma história do pós guerra)


Fomos ao teatro ver a companhia de Brecht, o Berliner Ensemble, apresentar Mãe Coragem.
Nenhuma companhia alemã tinha até então ousado montar uma peça em Paris.
Jack previa um tumulto: alemães, assim tão cedo; com certeza seria arriscado demais; mas nós iríamos.
Seria uma ocasião histórica. Afinal de contas, era Brecht.
Noite de estréia: o teatro estava lotado, havia pessoas de pé e, lá fora, policiais demais.
As coisas não caminharam sem tropeços. Houve tempo apenas para um ensaio inadequado. A história de guerra, tão apropriada para o tempo e o lugar, desdobrava-se em silêncio.

Ninguém se mexia.
Houve algum problema com os acessórios cênicos, mas todos continuaram imóveis.
Não houve intervalo, porque estava tudo atrasado. Logo o silêncio tornou-se insuportável: significava que estavam detestando? Que a platéia avançaria rebelada até o palco, numa espécie de represália ou vingança?

Quando a peça terminou, com as palavras “Levem-me com vocês, levem-me com vocês” e a velha abjeta, sem mais nada, de novo tenta seguir o exército, houve algo assim como um gemido por parte dos franceses.
Silêncio, silêncio, ninguém se mexeu, por um bom tempo – e então todos se levantaram, aos berros, aplaudindo, chorando, se abraçando, e os atores parados no palco, chorando também.
Tudo isso durou uns bons vinte minutos.
Lá pela metade, a demonstração deixou de ser espontânea e transformou-se na Europa consciente de si mesma, a derrotada e desgraça Alemanha implorando à Europa, "Levem-me com vocês, levem-me com vocês".
Eu nunca tinha tido uma experiência como essa no teatro, que me ensinou finalmente que uma peça pode ter sua ocasião perfeita, como se tivesse sido escrita para aquela única apresentação.
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Doris Lessing, em seu livro de memórias, discorrendo sobre o poder do teatro.
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Você conhece a obra de Bertold Brecht? Já assistiu, teve a chance de ler algo escrito por ele? Deveria.
O texto (Mãe Coragem) ao qual Doris Lessing se refere, é considerado uma das obras-primas criadas por Bertolt Brecht em 1939. Seu enredo desenrola-se durante a Guerra dos Trinta Anos - conflito religioso e político entre católicos e protestantes, ocorrido na Europa de 1618 a 1648 -, e apresenta a figura de uma comerciante que, puxando sua carroça de bugigangas, vive do dia-a-dia da guerra. Seus filhos, um a um, vão sendo mortos, restando-lhe a solidão e o destino incerto em meio à devastação. (Fonte: Enciclopédia Itaú Cultural)




4 comentários:

  1. Oi, td b? Nunca lia nada sobre ela, mas tomei gosto pelo teatro no último mês... muito bom!!! Bjs e fique com Deus. Blog atualizado!!!

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  2. Seja bem vindo!
    Fantástica iniciativa do sarau, adorei. Queria poder prestigiar. Um dia quem sabe né?!
    Gosto mesmo de Mário Quintana e Leminski, um dos meus favoritos.
    Beijo grande, volto por aqui.
    :)

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  3. É a primeira vez que passo por aqui...e gostei muito, já sou um seguidor viu. Super interessante seu espaço.


    abraços


    Hugo

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  4. sem conhecer, sem ver, emociono-me junto!!!

    otimo, mestre.
    beijos.

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