Cidade Dormitório (ou o amargo gosto de não estar em cena)

Joca querido,


Seus textos são sempre desafiadores, saiba.
Como numa realidade quase quase paralela, vibra palavra a palavra, um estado de amortecimento irreal que nos consome lentamente. Ler seus textos é como um mergulho em apnéia. Quando achamos que já não temos mais ar, surge uma lufada e nos faz abrir um sorriso. Sim, estamos vivos. Em pequenas partes. Aqui, ali, mais à frente. Um blogue ou outro. Queremos colocar um pé no virtual, mas sem se desprender do que é factual.

Ainda prefiro conversas olho-no-olho, ainda uma boa garrafa de uma boa bebida, seja ela qual for - o mais importante é sempre o encontro. Ainda prefiro minha rede de pouco mais de uma dezena de amigos, ao invés dos 1000 que o Orkut possibilita ou aos 5000 do Facebook. Balela.

Mais uma vez, lendo seu texto pensei nesta maldita cidade-dormitório, dominada por gente de exatas, faculdades de exatas, cursos técnicos e fatec's. Uma política dominada por gerentes, gestores e tudo o que cabe a uma grande empresa. Somos então uma cidade-empresa, abarrotada de engenheiros e arquitetos.Contrapondo ao excesso de exatas, a humanidade talvez esteja relevada às esmolas que se dá a moradores de rua, flanelinhas e crianças-malabares de semáforos. Salvo-conduto para um lugarzinho no céu.
E ainda insistimos em falar de cultura, encenar espetáculos que falam sobre cultura, promover saraus, escrever em blogues, disparar aos amigos (e inimigos) emails provocativos. Pra quê?

Sim, pra que nos sintamos um pouco mais vivos nesse espaço específico - entre a camada amorfa e a anestésica - em que nos encontramos. Todos. Sem dó nem piedade.

E, da próxima vez, vê se acerta meu sobrenome, cara pálida. É Puosso. E uma letra no lugar errado, faz toda a diferença.


Abraços cordiais,


wallace p./agosto' 10